A Copa da África rendeu mais um recorde para a "menor emissora do mundo": o de maior audiência de sua história. Com equipe diminuta (5 pessoas), recursos escassos e transmissão limitada a um televisor empoleirado num muro da cidade mineira de Sabará, a TV Muro conseguiu reunir na calçada 25 telespectadores para acompanhar o jogo do Brasil contra a Costa do Marfim, no último domingo.

O recorde anterior era de 20 pessoas, que pararam para ver um reality show involuntário: o dono da emissora esquecera a câmera ligada durante uma discussão entre sua irmã e seu cunhado.

A TV foi criada há 14 anos por um ex-servente da prefeitura, hoje funcionário do setor de comunicação: Francisco Dário dos Santos, 37. Durante a Copa, ele se transforma em Chiquinho Galvão, nos shows do intervalo que estreou neste ano. Ao seu lado, "Mamãe Bueno" --a mãe de Santos-- ajuda nos comentários, transmitidos de dentro de casa para o televisor do muro e assistidos por quem sobe e desce a ladeira ao lado da igreja São Francisco.

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Nos próximos jogos, Santos quer inovar mais ainda e fazer uma "transmissão volante": planeja colocar um televisor em cima de um Chevete 1980. A ideia é exibir cada partida da seleção brasileira em um ponto diferente da cidade histórica de 120 mil habitantes.

Nidin Sanches/Folhapress
Espectadora acompanha jogo da seleção brasileira pela TV Muro, em Sabará
Espectadora acompanha jogo da seleção brasileira pela TV Muro, em Sabará

Murojac

Na TV Muro, ninguém recebe salário. Os voluntários se dividem entre funções como cinegrafista, editor, figurinista e repórter. São eles que produzem o "Jornal Legal", "Muro Repórter" e "A Hora da Janta", entre outros programas.

As atrações são exibidas à noite, mas não têm horário nem periodicidade fixa. Os intervalos comerciais incluem anúncios de três estabelecimentos da cidade, que pagam R$ 20 por ano.

Quase nada foi comprado para equipar o "Murojac" --brincadeira com os estúdios da Rede Globo. O aparelho para transmissão ao vivo foi achado no lixo, o computador foi doado e o teleprompter --equipamento que mostra as falas do apresentador-- funciona à base de uma manivela para girar o papel com o texto escrito à mão.

Para simular imagens áreas, Santos criou o "Murocop". É uma miniatura de helicóptero feita com garrafas pet, que fica pregada num cabo de vassoura junto com uma câmera digital. Quando o cabo é erguido no ar, a câmera registra imagens do alto.

"Aqui nada é profissional, é tudo amador e cheio de gambiarra", diz o idealizador da TV.

No ar

A Folha acompanhou as transmissões do primeiro jogo do Brasil, contra a Coreia do Norte, ao lado das 13 pessoas que pararam para ver a TV Muro na calçada. Na hora do intervalo, Chiquinho vai para o estúdio improvisado num quarto da casa, de onde faz os comentários do jogo ao lado de sua mãe, Maria da Piedade, 71. Lá fora, os torcedores acompanham a transmissão ao vivo, da sala para a rua, e um repórter interage com torcida e apresentadores.

Nidin Sanches/Folhapress
"Mamãe Bueno" e "Chiquinho Galvão", no intervalo
"Mamãe Bueno" e "Chiquinho Galvão", no intervalo

"É gostoso porque reúne o pessoal. Aqui em Sabará, fora na TV, não tem onde se reunir para assistir ao jogo", comentou Filipe Arlindo, 19.

Chiquinho promete fazer bolão entre os espectadores em todos os jogos. A primeira ganhadora foi uma adolescente, que levou um conjunto de canetinhas.

Com popularidade crescente, a emissora contabiliza mais de 900 assinaturas de visitantes, inclusive estrangeiros. Mas Chiquinho faz questão de reforçar o slogan: "TV Muro, cada vez menor".